Olá Henrique, primeiro agradecer o teu convite para este espaço que está vivo, arejado e construído na noite. A seguir saltitar pela memória, o que me agrada bastante. Na infância houve factos e personagens que marcaram o meu porvir, vou recordar uma personagem desse rol:
POUCAS FALAS
Era um mulato matulão, calado e sombrio.
Estou a vê-lo sentado no muro que protegia
Um imenso quintal cheio de uma estratégia
Onde o Tavares aprendia, com tal brio
Que, nas raras ocasiões em que o som
Saía da garganta sentíamos um Homem-Bom.
Quando alguém lhe perguntava onde era a rua tal
Respondia de imediato: é na casa do Sr. Bom-Dia!
Se lhe gabavam o que tinha vestido, resposta fatal:
Comprei na casa da D. Carqueja, prima da azedia
E sogra da inveja! Os miúdos do bairro
Idolatravam-no no entardecer cianopirro.
Com ele estabeleceram uma curiosa relação
Em que a comunicação era feita por actos
E não de falas, em que se escutava o coração
Bem antes dos conspurcados dialectos,
Onde, sem pedir, existia uma protecção
Mútua, simétrica e rodeada de circunspectos
Rituais, imperceptíveis para os miúdos
Mas inatos naquele mulato de olhares barbudos.
Kambuta
Um abraço a todos os que aqui irão permanecer.
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