segunda-feira, janeiro 15, 2007

PAIXÃO



De Manuel Alegre, o menos que posso dizer, é que gosto dele.
Gosto dele como escritor e poeta, um dos nossos maiores.
Gosto dele como pessoa, consistente, lutando contra todos os moinhos de vento que nos estragam a paisagem.
Gosto dele como político, políticamente incorrecto.
É um perdedor, claro!
Neste país pequenino, onde muitos anseiam por um pequeno quinhão de poder, ser políticamente correcto ajuda, ainda que isso se traduza na ausência completa de envolvimento militante, nas grandes causas que preocupam os povos.
Na verdade, apesar de perdedor, tem o seu lugar na História. Os outros ficarão na penumbra que tanto fizeram por merecer.

Tudo isto a propósito de quê?

Manuel Alegre teve a gentileza de me oferecer o último livro dele.
Li-o com muito agrado e, constatei o óbvio, o que já antecipadamente sabia.
Num tempo de falsos intelectuais, o poeta fala apaixonadamente de futebol.
Como eu!
Como muitos outros, que acham que viverem as suas paixões não é nenhum crime e, que isso não tira espaço para todas as outras questões importantes.
Só ele poderia ter escrito o que se segue.

"Futebol joga-se com onze? Futebol joga-se com todos. Fomos um povo inteiro a jogar contra a Inglaterra, à excepção de meia dúzia de casta superior, que todos sabemos quem são. Futebol joga-se com todos. E não apenas na alma, mas com o corpo todo. Não há pedaço de mim que não me doa. Foram cento e vinte minutos, mais os pontapés da marca de grande penalidade. Quando dei por mim estava de mãos dadas com os meus vizinhos do lado esquerdo, agora amigos intimos, e com o do lado direito, o meu companheiro de infância juiz conselheiro Afonso de Melo, todos de mãos dadas, todos a fazer macumba, todos na baliza e todos a chutar. Não foi só o Ricardo, o herói da noite, que afastou Nuno Valente e resolveu ser ele a marcar. Fomos nós todos dentro dele. Milhões de pés no pé direito de Ricardo. Futebol joga-se na alma, joga-se com o corpo, futebol joga-se com tudo. E não só os que estavam no estádio, mas os que estavam em casa, nos cafés, na rua, em frente dos grandes ecrãs..."

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