Dois excertos do extraordinário livro de Irene Valejo, "O infinito num junco", para esclarecer os ignorantes que acham que queimar livros ou alterá-los, para que sejam mais políticamente correctos, vai alterar o curso da História. De uma assentada mostram a sua imperdoável ignorância, e a sua estrutura mental profundamente racista. Explodir os Budas, alterar obras primas, incendiar bibliotecas, querer danificar os monumentos dos Descobrimentos, é um acto ciclíco ao longo da História quase sempre alicercados em ignorantes, bárbaros a quem a cultura não diz nada e mostra-nos que há ainda um longo caminho a percorrer.
"Falemos por um momento de si, que lê estas linhas. Neste momento, com o livro aberto entre mãos, dedica-se a uma actividade misteriosa e inquietante, embora o hábito o impeça de se surpreender com aquilo que faz. Pense bem. Está em silêncio, a percorrer com o olhar filas de letras que fazem sentido para si e lhe comunicam ideias independentes do mundo que o rodeia neste momento. Retirou-se, para dizê-lo de alguma forma, para uma divisão interior onde lhe falam pessoas ausentes, fantasmas visíveis apenas para si e onde o tempo passa ao ritmo do seu interesse ou entendimento. Criou uma realidade paralela, uma realidade que só depende de si. Você pode, em qualquer momento, afastar os olhos destes parágrafos e voltar a participar na acção e no movimento do mundo exterior. Mas, entretanto, permanece à margem, onde escolheu estar. Há uma aura quase mágica em tudo isso."
" No caso da antiga Jugoslávia, arrasar o passado era uma finalidade de ódio étnico. Desde 1992 até ao fim da guerra, 188 bibliotecas e arquivos sofreram ataques. Um melancólico relatório da Comissão de Especialistas das Nações Unidas estabeleceu que na ex-Jugoslávia houve uma « destruição intencional de bens culturais que não se pode justificar por necessidade militar». Juan Goytisolo, que viajou à capital bósnia respondendo ao chamamento de Susan Sontag, escreveu no seu caderno de Sarajevo: « Quando a Biblioteca ardeu, fruto do ódio estéril dos lançadores de misseis foi pior do que a morte. A raiva e a dor daqueles instantes perseguir-me-ão até ao tumulo. O objectivo dos sitiadores - varrer a substância histórica desta terra para montar sobre ela um templo de patranhas, lendas e mitos - feriu-nos profundamente.»
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