segunda-feira, março 26, 2012

CHARCOS

Um dia, um ano, uma vida.
Uma eternidade de silêncios desbotados, comprometento os tons de azul.

Desmedida usura de palavras sem som, sem sentido, sem nada.

Apenas o vazio que fica nas nódoas de uma escrita arrogantemente efémera.

Charco onde se atolam quotidianos minúsculos, de improváveis tecelões de futuros.

quarta-feira, março 14, 2012

VENTOS?


O vento ruge vindo de sul, sempre de sul, virando as folhas do meu bloco, impedindo a escrita.
Mesmo as palavras já escritas, são arrastadas por este vento meridião, ficando nas folhas apenas vestígios. Quem ler não vai entender.
Quem ler, pensará apenas que o poeta é louco varrido. Como pode o vento arrastar palavras agarradas nas folhas?
E no entanto, o bloco é imaginário, as palavras também.
O vento esse é bem real, turbulento, circula-me nas veias com uma ferocidade cada vez maior.
E deixa tudo arrasado por onde passa.
Um dia vai-me arrastar também. Rumo ao sul claro.

domingo, março 11, 2012

A BICICLETA QUE TINHA BIGODES

Ondjaki é sempre surpreendente. E para nós angolanos, que já fomos meninos e que já andamos pelas mesmas ruas dessa pátria tão amada, cada livro dele leva-nos de volta.
Este novo tem um prefácio de pessoas que eu conheço pessoalmente. O tio Rui, escreveu um livro mágico, "Quem me dera ser onda".

- Tio Rui, posso falar dos restos de letras que a tia Alice tira do teu bigode à noite?
- Podes.
- Não vão querer vir na nossa rua roubar a caixa de letras?
- Não. Ninguém vai acreditar.

Sobrinho
Claro que podes que ainda a rua já é a mesma outra de nome mudado e tudo, não se pode mais jogar futebol, nem ouvir pássaros, nem sapos, é só o engarrafamento dos jipaços, parecem estilhaços das sirenes do cimento bem armado de mãos nos bolsos dos calos dos sapatos. Podes, com palavras pode-se mesmo traduzir a voz do silêncio. Com bigodes e a fazer de guiador de uma bicicleta que desce para cima sem travões. Podes, sim senhor, falar dos restos de letras que, felizmente andamos a semear. Katé!
Tio Manuel também Rui.