Cena 1: uma menina, de mais ou menos oito anos e magrinha, segura-se em uma barra de ferro e balança o corpo de lá para cá, imaginando ser uma trapezista.
Cena 2: estatelada no chão, a menina soluça.
Cena 3: no quarto dos pais, deitada sobre a cama, a menina está em silêncio, mas seu corpo treme, para desespero da mãe, que chora.
Cena 4: chega, finalmente, o pai, médico, que sem olhar para a menina e dizer uma única palavra, paf, bate no rosto da mãe, não na menina.
Cena 5: a menina apaga.
Cena 6: nauseada, a menina acorda em um quarto de hospital, no lugar da camisola, veste um colete de gesso; a mãe, com um cigarro aceso, continua a conversar com as amigas.
Cena 7: em casa, o gesso coça e esfola; a menina pede a deus que, por favor, a ajude, e pede uma vez mais no dia seguinte e no outro, por duas semanas.
Cena 8: sentada à mesa, a família almoça; o pai, distraído, diz à mãe, hoje, essa menina tem de ir ao hospital às duas horas para trocar o colete; a mãe, prontamente, diz não posso; nesse horário, tem o sono da beleza; ao que ele responde ter o do sagrado trabalho.
Cena 9: outra vez aos soluços, anda, só, pela rua, a menina de mais ou menos oito anos e magrinha; na portaria do hospital, basta falar de quem é filha.
Cena 10: na sala pequena e bege, um homem sangra sobre a cruz pregada na parede e, da veneziana semi-aberta, escapa um facho de luz. A menina, sentada sobre uma mesa, olha ora para um ora para outro, enquanto ouve a voz calma da enfermeira dizer: cuidado, doutor, que ela deve estar em carne viva.
2 comentários:
Este é o lado B da vida. e, infelizmente conheço gente assim.
Essa menina, teve uma dura batalha para vencer, mas tenho a certeza que conseguiu.
Bjs
GED
Imagino que sim. E acredito que sim. Bjs. B.F.
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